Hoje, depois de um banho quente e acalentador nesse dia cinza, me olhei no espelho, como é de praxe. Depois de desembaçar um pequeno círculo onde cabia a circunferência do meu rosto, comecei a notar as primeiras imperfeições no pentear dos cabelos: floquinhos brancos e molhados foram delicadamente removidos e desci o julgamento pra testa, que podia ser nova morada de cravinhos ou pele ressecada de frio. Passei logo protetor solar abundantemente - para evitar envelhecimento precoce, né? - e reparei nos pelinhos do bigode - "essa merda precisa sair daí".
Até então debruçada sobre a pia com a cara colada no espelho, voltei o corpo e pensei, com toda a lógica que isso pode ter: "ser mulher depois dos 20 anos é uma bosta". Com o perdão das leitoras feministas, mas vocês hão de concordar que esse planeta não é exatamente o lugar mais confortável pra se viver se você não tem um pênis e as liberdades que isso implica.
Na verdade, começa antes dos 20, e não estou me referindo a menstruação, logicamente. Afinal essa é uma das poucas coisas naturais que resta nas mulheres, então, apesar de ser mais desconfortável em alguns casos, é absolutamente normal. Mas, estranhamente, em mulheres desenvolvem-se pêlos a mais a partir dos 16: nas sobrancelhas, axilas, virilha, buço, coxas, panturrilhas, em alguns casos na barriga, pescoço, rosto e até nos dedos do pé!
Uau! Percebem QUANTA imperfeição precisa ser eliminada para que, por exemplo, uma mulher possa andar na praia com pouca roupa? É claro que alguém vai dizer "Ninguém obriga a mulher a nada. Ela que escolhe a sua aparência". Ok. Mas, olhando agora pelo senso comum e tendo em mente o que fazer para evitar constrangimento... todos sabem o que é, digamos,
oportuno.
Agora é a vez desse mesmo alguém pensar: "Oras, mas se deter ao que os outros estão pensando é meio bobo". Até que é, mas lembremos que vivemos em sociedade e, fatalmente, as coisas que fazemos serão julgadas e haverá ou não um tratamento diferente perante nossas ações, dependendo também da cultura do seu país. E nós estamos no país bunda-futebol-praia-carnaval.
E por que, afinal, as mulheres cedem a essas "regras de comportamento" se não concordam com elas - as que não concordam -, se sentem oprimidas ou se simplesmente estão confortáveis com seus pêlos, seu peso ou seus seios pequenos?
Bem, a resposta está, há décadas e décadas de lavagem cerebral, nas revistas femininas, masculinas, na TV e, na verdade, em qualquer mídia em que aparece, mesmo que de passagem, uma mulher com roupas mínimas te oferecendo algo que você PRECISA. Não existem muitas variáveis nesse caso. O máximo de mudança que podemos ver é, além da loira, a morena e a ruiva, vez ou outra a negra, sabe como é, existe a cota e pega mal pender para um lado. Cada uma delas magra, proporcional,
clean.
A coisa fica um tanto mais grave no caso de regimes mirabolantes e cirurgias plásticas. Estes aspectos específicos eu simplesmente dispenso e reprovo quando é questão puramente estética - com ressalvas à sensação básica de bem estar. O problema, nesse caso, é o quanto se foi influenciada pelo meio e pela publicidade que metralha descaradamente ofensas quanto ao que realmente somos e sussurra constantemente nossas novas necessidades. Então, surge a dúvida de quanto as mulheres querem a mudança porque realmente precisam e gostariam e quanto querem porque foram ensinadas a achar que é o melhor caminho para a aceitação.
O constraste de sexos é evidente, apesar de neuroses semelhantes estarem bem mais em voga para homens ultimamente. Nesse caso, homens, fiquem de sobreaviso e queimem a próxima Men's Health que cruzar o seu caminho.
E, mulheres, independente de quanta cera quente, loção hidratante, creme esfoliante, máscara de pepino, adstringente facial, pinça, pó descolorante, óleo corporal, creme de caviar revitalizante antirrugas, bronzeador a jato, malhação desenfreada, lipoaspiração e quilos de maquiagem vocês achem que precisam usar, lembrem-se que, invariavelmente, vocês são melhores que isso.